terça-feira, 4 de fevereiro de 2014
Maternidade
Sinto muito, mãe.
Ninguém deveria enterrar um filho. Muito menos assistir à sua cria definhar dessa forma.
Eu vejo a preocupação em seus olhos, eu sei que você quer ajudar. Eu quero que você me ajude, quero que me salve, me abrace, me proteja. Eu sei que você o faria.
Mas não tem como, não é?
Por mais que você tente, não há como. Você me trouxe pra debaixo de seus cuidados novamente e... o que aconteceu? Não me ergui. Não... eu só fiquei no chão, me debatendo.
Dormindo.
Sinto muito, mãe. Não queria desapontá-la. Sei que fui uma criança promissora. Sei que fui incrível, você me criou bem. Me aventurei até além de suas lições. Fui uma boa criança. Mas não consegui ser mais do que isso.
Veja bem, mãe, outros me chamaram de mãe porque cuidei de alguns. Sim mãe, eu fiz uma familia também, mesmo que não de verdade. Mas eu ainda estava sozinha, mãe. Eu estava sozinha. E não sabia mais como chorar pra que alguém viesse me encontrar.
Agora eu não consigo mais chorar, mãe. Eu estou perdida. Eu sinto dor, mãe.
Mas eu não consigo mais chorar.
E eu não consigo mais me sentir segura em seus braços, mãe.
Você vai me abraçar quando eu morrer?
Caixa de música
Muito tempo se passou. E ao mesmo tempo nenhum tempo foi embora.
Já não choro mais. Nem tenho medo dos fantasmas, dos vultos que dançavam à minha volta, me assombrando. Não tenho medo.
Nem expectativas.
Uma sequência de falhas me trouxeram aqui. Eu tentei. Seriamente, eu tentei. Todas as vezes que eu parei de dançar então as engrenagens giraram e eu pude voltar. Hoje eu não ouço mais o mecanismo, eu não quero ouvir.
Tudo que eu faço é assistir as coisas girando, e vou sorrindo, ficando mais devagar, caindo aos pedaços. Mas eu nem tento mais. Nem me esforço mais pra ser, sentir, manter. E aos poucos tudo vai terminando de ruir. A música aos poucos vai ficando fraca de novo. Inaudível.
Não tem como dar mais corda. Alguém jogue essa caixinha no lixo.
Ela não quer mais funcionar.
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